1. Que imagem guarda V. Exa. da sua passagem pelo Ministério da Educação? Guardo uma imagem positiva. Em primeiro lugar, procurei servir o meu País o melhor que soube e pude. Em segundo lugar, tive a honra de pertencer a equipas competentes e qualificadas. Em terceiro lugar, pude contactar com dezenas e dezenas de escolas e centenas, senão milhares, de alunos e professores, na sua grande maioria disponíveis e empenhados em prol da educação e do desenvolvimento. Em quarto lugar, trabalhei com uma administração leal e dedicada e com parceiros com a larga maioria dos quais consegui estabelecer laços de entendimento e respeito recíproco. 2. Durante o seu mandato, qual a visão de V. Exa. para o Sistema Educativo? A minha visão foi naturalmente a visão do Governo a que pertencia, plasmada no seu programa. Inspiravam-na três apostas fundamentais: aposta na democratização do acesso e do sucesso escolar; aposta na formação ao longo da vida, da infância à idade adulta; aposta na autonomia das escolas e na sua inserção nos territórios e comunidades que servem. Esta visão inspirou vários objectivos programáticos que o XIV Governo, na sequência do trabalho desenvolvido pelo XIII, procurou cumprir. Entre esses objectivos recordo: a) promoção da educação básica para todos, numa lógica integrada desde a educação de infância ao terceiro ciclo do ensino básico; b) valorização do ensino secundário, com especial atenção aos cursos tecnológicos e profissionais; c) exigência de qualidade e avaliação no ensino superior; d) relançamento da educação de adultos, em particular na perspectiva da ligação entre educação e formação; e) participação acrescida dos pais, das famílias e das comunidades na organização, gestão e projectos das escolas; f) promoção dos instrumentos de combate ao insucesso e ao abandono escolar; g) promoção da estabilidade do corpo docente nas escolas; h) ordenamento e racionalização da rede do ensino superior. 3. Que reformas gostaria de ter promovido e não promoveu? Como é do conhecimento público, o XIV Governo não completou o seu mandato. Eu próprio mudei da Educação para a Cultura. Uma parte importante dos objectivos programáticos do Partido Socialista para a educação não puderam ser cumpridos no período 1999-2002 e foram, aliás, retomados, com as mudanças que a evolução das coisas aconselhava, no mandato que se iniciou em 2005. 4. As reformas que na altura entendeu por bem promover depararam com que tipo de dificuldades? As dificuldades principais com que me deparei nas funções que exerci no Ministério da Educação foram as seguintes: a) uma excessiva centralização do sistema educativo no Ministério e, portanto, uma muito deficiente descentralização de competências e recursos nas escolas; b) um culto generalizado do uniformismo e do regulamentacionismo, especialmente vivaz, para meu espanto, nas organizações sindicais dos professores; c) uma impressionante obsessão da opinião publicada e da generalidade dos “media” em tudo o que fosse dificuldades ou inêxitos, com a simétrica desvalorização de tudo o que representasse avanços, sucessos ou progressos nas nossas escolas; d) uma insuficiente interiorização, no sistema e seus actores, dos princípios da eficiência (como fazer melhor com os recursos disponíveis), da avaliação e da responsabilidade; e) algum esquecimento, por parte dos responsáveis e dos profissionais, daquela regra básica de que as escolas existem para servirem os alunos, as famílias e as comunidades, e não o contrário… Mas quero acrescentar dois pontos. O primeiro é que não me julgo isento de críticas. Acho que aprendi alguma coisa com essa experiência e também na parte em que entendo que errei nas propostas, nos métodos ou mesmo nos objectivos. O segundo é que não me deparei apenas com dificuldades. Bem longe disso, tive o enorme privilégio (face a muitos antecessores) de ter estado à frente do Ministério da Educação numa altura em que muito mais forte o envolvimento dos pais e suas associações, estava bem assumida pela opinião pública a necessidade da universalização da educação básica, crescia o número de estudantes, licenciados e pós-graduados no ensino superior e havia um claro propósito político de recuperar o atraso no investimento português na educação, em comparação com a OCDE. 5. Quais as mudanças significativas que se verificaram durante o mandato de V. Exa.? Entre as mudanças a que ficaram associadas as equipas a que tive a honra de pertencer, saliento estas: a) a constituição da Agência Nacional para a Educação e Formação de Adultos; b) o esforço da cooperação com os países de língua portuguesa, em particular a participação decisiva de professores portugueses na construção do novo Estado de Timor-Leste; c) a reorganização curricular do ensino básico e a estratégia de gestão flexível do currículo; d) a negociação de um novo regime de recrutamento e colocação de educadores e professores do ensino básico e secundário; e) a formação dos agrupamentos de escolas do ensino básico; f) a política de reordenamento e reorganização da rede do ensino superior. |