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Seomara da Costa Primo foi autora de inúmeros manuais escolares que acompanharam geração de alunos entre as décadas de 30 e 60 do século XX. Parte destes manuais integram actualmente a colecção de manuais escolares do Arquivo Histórico da Secretaria-Geral do Ministério da Educação e são documentos únicos: são os exemplares que concorreram ao “livro único”, um regime que perdurou no período do Estado Novo em que só podiam ser adoptados os manuais que fossem aprovados por despacho ministerial. Normalmente, autores e editores tinham que submeter os livros à aprovação mediante um requerimento a apresentar à DGEL (Direcção-Geral do Ensino Liceal). Todos os manuais de Seomara Costa Primo incluem processos administrativos de concurso, dos quais são parte integrante e cuja leitura ajuda então a compreender as opções e as práticas pedagógicas de uma época. A título exemplificativo é aqui ilustrado um processo administrativo de concurso(*) do Compêndio de Zoologia para o 4º, 5º e 6º anos dos Liceus (1939). Os processos administrativos de concurso ao “livro único” incluíam um requerimento, que devia ser acompanhado de: Requerimento para aprovação do manual escolar a) “Três exemplares da obra, rubricados em cada uma das folhas pelo apresentante, quando os livros não eram apresentados impressos” (Artº 2º do Decreto-Lei nº25 447, de 1 de Junho de 1935); b) “Uma memória explicativa (ver exemplar) do plano da obra, com quaisquer indicações sobre a edição projectada e os lugares das gravuras quando o livro não esteja ainda impresso e, com a menção do preço que o apresentante pretende atribuir a cada exemplar” (Artº 2º do Decreto-lei nº25 447, de 1 de Junho de 1935); Transcrição da memória explicativa (documento em formato PDF - 14KB) c) “Da quantia de 300 escudos, destinada à remuneração dos professores encarregados da apreciação”dos manuais apresentados” (Artº 2º do Decreto-lei nº25 447, de 1 de Junho de 1935). A apreciação dos livros incumbia a uma comissão composta por “dois professores metodólogos do respectivo grupo, ou pelos professores que os substituíam, sob a presidência dum professor universitário da especialidade, nomeado pelo Ministro da Instrução Pública” (Art.º 3º do Decreto-Lei nº25 447, de 1 de Junho de 1935). Os dois professores metodólogos (metodólogo: nome dado ao orientador dos estágios por cada uma das disciplinas do currículo escolar) eram também chamados relatores. Deviam proceder à análise dos livros submetidos a concurso, produzindo um relatório no final do qual era enunciada a respectiva classificação. Depois da sua elaboração, os relatores eram convocados para reuniões em que deviam discutir as suas opiniões e escolher o livro que lhes parecesse mais indicado para aprovação. O resultado a que chegavam devia ser fundamentado num parecer que teria de “constar de um relatório em que devia ser feita a rigorosa apreciação da obra no que respeita à conformidade com os programas, à pureza da doutrina, à correcção e clareza da linguagem, ao respeito pelas leis e interesses da Nação e à observância de todos os preceitos e requisitos de natureza pedagógica, concluindo pela proposta de aprovação ou rejeição, e, no primeiro caso, pela indicação do preço por que deve ser vendido cada exemplar” (Art.º 4º. Do Decreto-Lei nº25 447, de 1 de Junho de 1935). Parecer com despacho de aprovação e homologação Mesmo que os relatores concluíssem pela proposta de aprovação dos manuais escolares, poderiam ainda indicar no parecer um conjunto de alterações que os autores poderiam efectuar antes de apresentarem a redacção definitiva do manual. Como tal, após introduzirem as alterações indicadas no parecer os autores tinham de apresentar um novo requerimento, com vista à aprovação definitiva do manual: Requerimento com despacho de aprovação e homologação Este novo requerimento deveria incluir uma memória que dissesse respeito às “modificações introduzidas de harmonia com o relatório de aprovação”: Memória explicativa das alterações introduzidas no manual escolar Finalmente, o processo devia ser apresentado ao titular do Ministério da Instrução Pública, mais tarde designado por Ministério da Educação Nacional, que devia lançar nele “o seu despacho, podendo negar a aprovação do livro, embora contra o parecer das comissões, se houver motivos superiores que aconselhem a sua rejeição; em caso de aprovação, o despacho fixará o preço por que deve ser vendido cada exemplar”(Art.º 9º do Decreto-Lei nº25 447, de 1 de Junho de 1935). Quando aprovado um livro era publicado no Diário do Governo, o respectivo aviso. Os manuais que se apresentam nesta exposição encontram-se ainda na sua versão dactilografada, com as alterações rubricadas pela autora. À componente textual dos conteúdos programáticos previstos então para as Ciências Naturais (Zoologia, Botânica, Biologia), Seomara da Costa Primo adicionou aos mesmos uma forte componente ilustrativa, mediante o recurso a fotografias e desenhos, estampas e aguarelas da sua autoria. A autora, no Compêndio de Zoologia (1939) explica: «Todo o livro é profusamente ilustrado com desenhos, na maioria originais e, em menor número, boas adaptações; contém fotografias suas ou cedidas obsequiosamente; figuram esquemas onde são sintetizados certos assuntos. Algumas figuras aparecem menos bem reproduzidas, já por se tratar de gravuras envelhecidas por anteriores tiragens, e obtidas por simples prensa, já por serem feitas em papel de inferior qualidade, como se nota especialmente nas fotografias. Outras são apresentadas pelos próprios originais, de que houve fazer três exemplares, o que explica o serem menos completas ou pormenorizadas. […] Algumas estampas a cores concorrem para embelezar o livro e indispensáveis em bons livros de ciências naturais; pois, além de desenvolverem o espírito de observação e desejo de pormenor, despertam o sentimento estético e a curiosidade de contemplar quadros semelhantes na Natureza.» (p. 1) A publicação dos manuais aprovados de Seomara da Costa Primo foi divulgada na imprensa da época, como ilustram estes recortes de artigos de jornais, por si organizados:
NOTAS (*) Localização: AHME, DGEL, cx. 1835 Os recortes de imprensa pertencem ao espólio da Escola Secundária Seomara Costa Primo |